quinta-feira, 28 de junho de 2012

Morada

Something by Jim Sturgess on Grooveshark


Fui e não voltei mais. Está tudo lá, no seu devido lugar. Não retornei à nossa rústica casinha que me encantava os olhos por saber que o teu gosto e o teu toque tiveram guiado tudo em volta. Não era preciso de muito pra ser feliz, era preciso o nosso jeito, o teu jeito.

Eu, num canto confortável, apenas me encolhia com um violão na mão e ficava admirando tu girar pelos cômodos, torcendo para que o tempo passasse leve e demorado, e quando tu parasse da inquietação natural, poder doar meu braço e beijo pra ti.

Aqui fora tentei encontrar sentido em alguma coisa, quase que tentando me enganar que iria achar. Não tinha e nem tem o menor sentido em nada. Se meu estômago embrulha quando lembro de tu passando pra lá e pra cá, linda e simples, com aquela mesma camisa, sei que tu baixa a cabeça em dor ao ler, toda manhã, aquela frase que te escrevi.

Pois o que eu quero é voltar a escutar as mesmas músicas que deixei de lado em um disco que se perdeu da sua agulha, a reler os mesmos versos que hoje morrem lentos em um papel de letras informes, a dar os mesmos puros e tão naturais sorrisos, a acordar e ter motivos pra enfrentar tudo que vem lá de fora.

De modo inato, eu sei que fechastes a porta onde estavam os livros, discos, sorrisos, lembranças, objetos, e onde fica aquele sofá que cabe nos dois, aquela morada onde habita o que te faz e o que me faz feliz.

Eu também fechei, fui andar por aí, viver aquela semi-infeliz-vida que tanto a gente fugia, mas tenho certeza de que assim como tu não descartei nada. Sequer, também como fizestes, tranquei a porta, na esperança de voltar lá, sentar no nosso lugar, te ver entrar novamente, sentir o cheiro da felicidade mais uma vez, dar vida a todo o nosso pequeno, encantador, original, único e ao mesmo tempo imenso universo.

terça-feira, 26 de junho de 2012

Escombros

Black by Pearl Jam on Grooveshark


A verdade é que não sabia direito que passo dar. Não sabia se havia um passo a dar. Havia? Sequer tinha direção, quem dera ter um andar. Mas andei. Tapeei as cinzas, tropecei na linha errante do destino, mais uma vez. Se antes eu me perdesse, era só olhar o coração e eu saberia aonde ir. Mas e agora?

Tive uma linha do tempo apagada, destruída. Se antes, havia apenas uma direção, havia apenas um caminho a seguir e ser desbravado com a força dos que amam, agora não havia nada. Havia, somente, uma luz em torno de mim mesmo, e o resto era escuridão.

Era uma implosão. Foi derrubado tudo o que se arquitetou, pensou, executou, montou e habitou. Tudo ficou tão velho e a situação era tão incrivelmente nova. Um vazio desmoronado na linha contínua do espaço e tempo.

No meio ainda de tantos destroços achava objetos, lembranças, pedaços. Então resolvi voltar ao primeiro parágrafo, resolvi andar. Eu não sabia direito o que vestir, não sabia ao certo quem procurar, nem o que escutar. Uma coisa que eu tanto soube, e agora não mais: não sabia, ao menos, ser eu mesmo.

quarta-feira, 6 de junho de 2012

Planeje-se

The Lovers Are Losing by Keane on Grooveshark


Há de se pensar na vida. Sempre há, é uma prática comum e natural. Ao invés de viver, a gente tem feito isso, planejado, procurado, estudado as ações, colocado na balança o que é e o que não é útil, essencial e necessário pra nossa felicidade. Mentira. No fundo acho tudo isso uma bobagem, mas, enfim e mesmo assim, tenho dois planos.

O primeiro plano trata-se de trabalhar. É, trabalhar, crescer no mercado de trabalho que eu escolhi. Claro que antes disso vem a escolha da área a atuar, e antes disso ainda, vem uma série de questionamentos se é ou não conveniente fazer aquilo que eu escolhi, e se também tudo isso é viável. Certo, imaginamos que seja.

Mas e viver? Sejamos “adultos”, vamos deixar aquela guitarra de lado, vamos guardar aquelas anotações na gaveta, não vamos àquela conversa à toa de bar entre velhos amigos. Tem trabalho a fazer, não tem tempo pra desperdiçar, e pensar nos lucros futuros não é nada mal, não? Aquele carro, aquela casa, aquele futuro que tanto se quer. Tudo que sair disso é supérfluo e atrapalha.

O suor de agora vai me render bons números depois, não é? Procuramos, ainda, aquele velho sonho americano, de crescer na vida, superar dificuldades, ter bens e serviços, não ser um perdedor, não se tornar um loser.

Meus filhos não gostarão de serem levados à escola com um carro antigo que, apesar de ter laços afetivos e uma história, sejam inferiores ao modelo novo do pai do coleguinha. Eles não gostarão dos seus colegas chamando seu pai de loser. Doa a quem doer, evitemos isso, e vamos mostrar desde cedo aos nossos filhos que eles devem ser vencedores.

Pronto, vida feita, agora é colher os frutos do suor, trabalho, dedicação e empenho. Afetivamente, encontrar alguém disposto a contribuir pra isso, mas que esteja indo na mesma direção, e que ela não seja um incômodo no meu modo de traçar essa felicidade toda.

O segundo plano? Esquece as linhas passadas, esquece essa idiotice toda. O segundo plano é eu estar contigo, pois isso me faz feliz e dá força pra procurar o que realmente me faz feliz. O resto? O resto que se ajeite. O resto se ajeita.